O encaminhamento parece ser um documento muito simples, porém para produzi-lo é preciso compreender qual é o seu significado e objetivo a ser alcançado. Para tanto, o encaminhamento é um recurso instrumental que vai além de um recurso automático, ou seja, do preenchimento de um formulário já pronto. Trata-se do reconhecimento da demanda, do problema apresentado pelo destinatário e a incapacidade do serviço local de atendê-lo em suas particularidades.
Ao entender que as atribuições não competem a unidade, inicia se o processo de direcionamento do destinatário(a) para o local mais apropriado para atender suas necessidades. Ou seja a demanda que o destinatário(a) apresenta não pode ser atendida na unidade em que o profissional está, isso por motivos diversos. É possível que tal demanda não seja de competência da unidade, ou não há recursos disponíveis para o atendimento.
Algumas situações e problemas, não vamos conseguir resolver sozinhos, dessa forma é essencial o trabalho em rede. A complexidade das situações que os destinatários(as) muitas vezes apresentam dentro das unidades de atendimentos, seja pública ou privada exigem do profissional uma completude do seu trabalho em outros lugares.
O encaminhamento é um instrumental técnico e operacional que permitem ao profissional e ao destinatário(a) a formalização do processo de transformação da realidade. Ter clareza da demanda e conhecer a realidade são apenas alguns dos principais pontos essenciais para um bom encaminhamento, os quais serão descritos a seguir
É preciso ter clareza da demanda, das necessidades do destinatário(a)
É muito comum as pessoas, principalmente nas unidades públicas, procurarem atendimentos sem conhecer os serviços ofertados pela aquela unidade. Essa realidade é vivenciada por profissionais do SUAS e do SUS de todo o país, o que faz com que uma acolhida e uma escuta qualificada sejam imprescindíveis. Essa escuta parte principalmente da habilidade de se fazer as perguntas corretas e da forma exata que promovam um sentimento de confiança por parte do destinatário(a) tanto no trato da informação quanto na implicação da equipe em buscar respostas para a demanda.
Ao desenvolver apropriadamente a escuta da demanda, o profissional poderá então agir com maior assertividade junto à construção de processos de superação desta. Pois ao solicitar um serviço, o profissional pode identificar que a demanda não se enquadra aquela unidade, assim podendo auxiliar para gestão de recursos que possa ser mais bem explorada para atender as necessidades do destinatário ou da sua família.
Explorar todas as possibilidades da realidade relatada, pois a verdadeira concretude da demanda do destinatário(a) pode estar submersa abaixo de sentimentos como a vergonha, medo, ignorância e principalmente por falta de informações. Olhando atentamente para a situação declarada e respeitando os direitos dos destinatários(a) já se pode pensar inicialmente tanto no encaminhamento deste para outras políticas públicas.
Conheça bem a rede de atendimento
Esse é um ponto muito importante, que os profissionais devem entender, não basta apenas o profissional identificar que a demanda é de outra unidade sem conhecer quais os serviços que a outra unidade oferece e suas competências. Talvez esse seja o maior erro de alguns profissionais, realizar o encaminhamento sem conhecer a estrutura da rede para permitir um mínimo de concretude na intenção de encaminhar.
Uma das ações básicas seria circular o território para conhecer melhor a rede pública ou privada. Quais são os profissionais que atuam nessas redes, nessas políticas públicas? Como o destinatário(a) pode chegar até o atendimento? Quais os documentos básicos ele precisa ter em mãos? Como é organizado o atendimento neste lugar? Essas, e outras, seriam bons exemplos de perguntas a serem feitas.
Outra forma de qualificar melhor o conhecimento da rede é manter o contato com os outros profissionais, realizar encontros profissionais, estudar situações de casos com a mesmo destinatário(a) e entre outros meios de contatos.
Envolva o destinatário(a) ou a família no processo
Eles são o ponto central do atendimento e não deve ser esquecidos ou negligenciados em qualquer momento. Jamais cometa o erro de achar que você é quem tem o poder de resolver qualquer coisa para eles. O máximo que se pode fazer é contribuir, apoiar, orientar, direcionar. O real movimento de transformação deve partir do destinatário(a) ou da família.
O que isso quer dizer? Simplesmente que você precisa se atentar para o quanto o destinatário(a) considera importante a situação identificada por você, ou até mesmo considerar as prévias relações do destinatário(a) com os demais serviços da rede. Lembre-se, o destinatário(a) circula no território e procurou você para uma demanda específica.
Também é muito importante não tratar o destinatário(a), menosprezando seu poder de articulação ou ainda a subestimando na habilidade de se implicar para resolver as situações. Como em alguns casos, o profissional impede o destinatário(a) de se fortalecer na resolução de seus conflitos ao tentar resolver tudo por ele.
Permita que o destinatário(a) vá sozinha à outra unidade, intervenha apenas quando sua capacidade de circulação for limitada. Isso quer dizer, uma limitação física, mental, intelectual ou em situações de risco que venha colocar em perigo a vida do destinatário(a) ou do profissional. Essa intervenção pode ser por meio de contato pessoal com o outro profissional ou se necessário por outros meios de comunicações. Mas o importante é o profissional não faça tudo pelo destinatário(a). Incentive-a a propor soluções conjuntas para os problemas vividos, a participar do processo de resolução. Proponha caminhos possíveis, dentro do que o destinatário(a) a família é capaz de andar.
Tenha o melhor instrumento
Para corresponder à excelência do trabalho desenvolvido e descrito até este momento, é muito importante ter o instrumento ideal que concentrará de forma sucinta todos os pontos tratados. Tal instrumento, normalmente construído em modelo de formulário, constitui tanto uma formalização do procedimento quanto outorga a família uma materialidade do atendimento.
Ao sair do atendimento, nem sempre os destinatários(as) se lembram dos detalhes ocorridos durante o atendimento, chegando a esquecer nome de quem a atendeu e as vezes até mesmo o nome da unidade. Ao ser entregue um o encaminhamento, ele poderá relembrar as orientações prestadas.
Para a construção deste instrumento, três campos são essenciais: Identificação, com data; conteúdo e formalização. É preciso identificar as partes envolvidas, como segue o modelo abaixo no link.
Quem está realizando o encaminhamento, descrevendo o nome da unidade, profissional de referência e contato;
Nome completo do destinatário(a) encaminhado
Unidade a que se destina o encaminhamento com descrição do setor específico ou área profissional de indicação de atendimento da demanda.
Também é necessária uma descrição sucinta da demanda do destinatário(a) com a indicação do profissional do que avalia ser importante para satisfazê-lo. Por fim, é preciso ter um espaço específico para assinatura do profissional que realiza o encaminhamento e do destinatário(a) que recebe o encaminhamento, tornando o formulário um documento formal para a unidade. Acho importante ter duas vias, uma fica com o profissional e a outra com o destinatário(a) como documento de registro.
Vai ter situações que a demanda do destinatário(a) ou de sua família vai ser da competência da unidade onde você trabalha, porém ele(a) pode apresentar outras demandas, ou seja, vulnerabilidades que sejam de competência de outras políticas públicas; ao ser atendido pelo profissional e a unidade suprir algumas demandas, o processo de encaminhamento para os demais serviços é o mesmo, o encaminhamento de ser entregue para o destinatário.
Pode acontecer situações que o destinatário(a) nem procure a outra unidade, chegando em até perder ou rasgar o encaminhamento. Mas como saber se o destinatário(a) procurou a outra unidade? Essa é a parte que entra a boa relação com a rede, o contato os outros profissionais podem ajudar a identificar o interesse do destinatário de resolver sua demanda. Em situações de não comparecimento, temos que esperar o momento em que essa vontade de resolver as demandas parta dele mesmo. Quando apertar a necessidade, pode surgir os primeiros passos sozinho, ganhando a autonomia de resolver seus próprios problemas.
Bom terminei, espero ter ajudado...
Vou deixar 3 links com modelos de encaminhamentos para baixar, para ter uma ideia de como produzir esse documento. Lembrando que cada profissional pode produzir o que achar melhor, desde que atenda as normativas do documento respeitando as demandas/vulnerabilidades dos destinatários(as).
Link 1: modelo explicando os detalhes do documento
https://drive.google.com/file/d/1xuqjvn1bw9iU81_zurf10S_hAYza1V3U/view?usp=share_link
Link 2: modelo de encaminhamento, por considerar que a demanda não é competência da unidade que atendeu.
https://drive.google.com/file/d/1sCB4iOm7YCzaXUNJ9TpMuk5Bfznrkt_8/view?usp=share_link
Link 3: modelo de encaminhamento, onde a demanda apresenta competência da unidade que atendeu, porem também apresenta demandas de outras políticas públicas.
https://drive.google.com/file/d/1EFwXk2JFcADX_liJMetmnYNQZBz1Vs4a/view?usp=share_link
Abraços..
Cleia Machado